
Com Trump de volta, cúpula da Otan é a mais importante desde a Guerra Fria?
Europa se prepara para a chegada de Trump à cúpula da Otan com questões difíceis sobre o Irã e os rumos da defesa, após exigência dos EUA de que os aliados passem a gastar 5% do PIB. Cúpula começa nesta terça-feira na Holanda e será a primeira com a presença de Trump desde que ele foi reeleito.
Dursun Aydemir/Anadolu/Getty Images via BBC
Enquanto o mundo prende a respiração para ver o que acontece depois dos ataques diretos dos EUA contra instalações nucleares iranianas e o frágil cessar-fogo anunciado entre Israel e o Irã, o presidente americano Donald Trump é esperado na Holanda nesta terça-feira (24/06) para a cúpula da Otan.
Essa será a primeira reunião de Trump na Otan desde que ele foi reeleito. No passado, ele acusou os países membros da aliança de se apoiarem demais nas garantias de segurança dos Estados Unidos. Agora, os aliados europeus estão desesperados para provar que ele está errado e esperam convencê-lo a não retirar tropas americanas do continente.
“As relações com a Europa estão tão tensas desde que Trump retornou à Casa Branca — por causa das tarifas e outras questões — que, até algumas semanas atrás, nós não sabíamos se ele ia aparecer nessa cúpula”, me disse um diplomata de alto escalão sob condição de anonimato.
“Com a Rússia e a China de olho em qualquer sinal de fraqueza do Ocidente, isso teria sido um desastre.”
O secretário-geral da Otan, Mark Rutte, montou essa cúpula em torno de Trump. Ele pretendia bajulá-lo concordando com um aumento significativo nos gastos com defesa para mostrar que os europeus estão dispostos a assumir mais responsabilidade pela própria segurança.
Rutte também esperava que, ao manter o encontro focado na questão financeira, ele conseguiria evitar qualquer atrito ou explosão entre Trump e seus aliados.
Mas esse plano, que foi cuidadosamente elaborado, pode estar desmoronando.
Agora que o Irã lançou mísseis nas bases americanas no Catar e no Iraque, em resposta aos ataques de sábado (21/06) contra suas instalações nucleares, o presidente dos EUA pode decidir permanecer na sala de crise da Casa Branca, em Washington.
Se ele realmente for para a Europa, como é esperado, como será possível não falar sobre o Oriente Médio considerando o que está em jogo?
Isso abriria espaço para um possível conflito entre Trump e os aliados europeus, que defendem a via diplomática — e não bombardeios — no caso no Irã.
Trump adora uma vitória e ele é extremamente sensível a críticas. Ele não vai querer nenhum tipo de desaprovação durante a reunião da Otan.
Separadamente, já tinha sido garantido a ele um triunfo na cúpula, com países europeus se comprometendo a gastar impressionantes 5% do PIB com defesa — exatamente como ele exigiu nas primeiras semanas após voltar à Casa Branca.
“Essa cúpula é sobre credibilidade”, resumiu o embaixador dos EUA na Otan, Matthew Whitaker.
Mas, no domingo, a Espanha afirmou ter conseguido uma exceção nesse plano de gastos, algo que Rutte negou.
Outros aliados europeus que também estão com dificuldades para encontrar esse dinheiro extra começaram a mostrar incômodo.
A questão é: a Europa precisa manter os EUA, uma potência militar e nuclear, do seu lado. Foi assim que Rutte conseguiu convencer líderes relutantes — com exceção da Espanha — a aderir à nova onda de gastos. É um compromisso enorme.
Mas, como me disse a ex-embaixadora dos EUA na Otan, Julianne Smith, mesmo assim, não há garantia de nada com Trump.
Não está claro se os Estados Unidos vão assinar a declaração conjunta ao final da cúpula desta semana, que deve apontar a Rússia como principal ameaça à aliança da Otan.
A confiança da Europa nos EUA como seu protetor final tem sido abalada pela postura aparentemente branda de Trump em relação a Moscou, e também pela pressão agressiva que ele tem feito sobre Kiev ao tentar encerrar a guerra na Ucrânia.
Além disso, na noite de sexta-feira (20/06), quase dava para ouvir os diplomatas europeus “rangendo os dentes”, depois que Trump justificou, com naturalidade, a meta enorme de 5% em gastos com defesa que impôs aos aliados, ao mesmo tempo em que isentava a si próprio e os EUA desse compromisso.
“Eu não acho que nós deveríamos, mas eu acho que eles deveriam”, disse Trump. “Nós temos apoiado a Otan por tanto tempo.. então, eu não acho que nós deveríamos, mas eu acho que os países da Otan deveriam, com certeza.”
Por outro lado, os líderes europeus discutem se eles deveriam estar mais preparados nesse sentido, em termos de auto-defesa.
Trump talvez seja o mais direto e imprevisível, mas está longe de ser o primeiro presidente a querer redirecionar a atenção militar e os investimentos da Europa para outras áreas prioritárias, especialmente o Indo-Pacífico. O próprio Barack Obama foi muito claro sobre isso em 2011.
Os Estados Unidos têm armas nucleares armazenadas na Itália, Bélgica, Alemanha e na Holanda. Também têm cerca de 100 mil soldados prontos para combate espalhados pela Europa, 20.000 deles posicionados em países da Otan no Leste Europeu, enviados por Biden depois da invasão em grande escala da Rússia na Ucrânia.
O continente até poderia compensar uma possível redução no número de tropas americanas, especialmente com a Alemanha e Polônia planejando expandir significativamente suas forças terrestres nos próximos anos. Mas, a dependência da Europa dos Estados Unidos vai muito além disso, diz Malcolm Chalmers, vice-diretor do Royal United Services Institute.
A Europa depende de Washington para coleta de inteligência, vigilância, capacidade aérea e comando e controle. Os EUA exercem um papel de liderança crucial na Otan, integrando forças e aliados.
Essas são exatamente as capacidades escassas e necessárias para os militares americanos na Ásia, diz Chalmers. Se forem removidas da Europa, levaria muito tempo para serem substituídas.
Até pouco tempo atrás, muitos países da Otan na Europa evitavam investir em certas capacidades continentais — como, por exemplo, ampliar o alcance do chamado guarda-chuva nuclear da França para outros aliados — por medo do que os EUA diriam: “Ah, então vocês não precisam mais da gente. Estamos fora!”.
Mas, agora, a Europa está sendo forçada a assumir mais responsabilidades pela própria segurança, não apenas para persuadir Washington a ficar, mas também no caso do presidente dos EUA decidir se retirar, de forma parcial ou total.
Ninguém sabe das intenções de Trump.
Os líderes europeus na Otan sentiram um grande alívio recentemente, quando a administração americana anunciou que o tenente-geral da Força Aérea dos EUA, Alexus Grynkewich, assumiria o cargo de Comandante Supremo das Forças Aliadas na Europa, uma posição tradicionalmente ocupada por um americano. Isso foi interpretado como um sinal de compromisso com a aliança de defesa.
Mas Washington está conduzindo sua própria revisão de gastos militares e de defesa. Anúncios oficiais săo esperados nos próximos meses. É pouco provável que haja novos financiamentos dos EUA para a Ucrânia. E muito provável que as 20 mil tropas adicionais enviadas ao Leste Europeu sejam as primeiras a serem retiradas do continente.
Apesar disso, a Polônia disse que vai participar da cúpula da Otan com confiança. Em nítido contraste com a Espanha, Varsóvia acredita que está dando o exemplo — gastando mais do seu PIB em defesa (cerca de 4,7%) do que qualquer outro membro da Otan, inclusive os EUA. O objetivo do país é construir o exército terrestre mais poderoso da Europa.
Durante a Guerra Fria, a Polônia viveu sob a sombra da União Soviética. O país faz fronteira com a Ucrânia. Por isso, não é difícil convencer os poloneses que a defesa é uma prioridade.
Para políticos em países distantes da Rússia, o argumento é mais difícil. A imprensa espanhola tem sido alimentada com especulações de que os desacordos sobre os gastos com defesa podem até derrubar o governo de coalizão do país.
Tentando ao mesmo tempo agradar Trump com o compromisso de aumentar os gastos com defesa, enquanto torna a proposta mais palatável para líderes europeus com orçamentos apertados, a Otan está propondo dividir a meta de 5% em duas partes: 3,5% da renda nacional anual seria destinada à defesa, com os outros 1,5% do PIB para áreas “relacionadas à defesa”, como, por exemplo, a expansão de portos de carga na Holanda ou o investimento da França em cibersegurança.
Esse modelo ainda teria a vantagem de alinhar a Europa com o nível atual de gastos militares dos EUA, que está em 3,4% do PIB, um marco simbólico importante, segundo Camilla Grand, ex-secretário-geral adjunto de Investimentos em Defesa da Otan e hoje especialista no Conselho Europeu de Relações Exteriores.
Mas, independentemente de como ficarão os números, nós estamos falando de governos gastando bilhões a mais com defesa. E esse dinheiro precisa sair de algum lugar — seja por meio de novos impostos (um método que a Estônia tem experimentado), seja por meio de mais endividamento, o que sai caro para países como a Itália, que já tem altos níveis de dívida pública.
Outra opção é cortar gastos sociais, o velho dilema conhecido como “canhões ou manteiga” ou “tanques ou pensões”.
Com sua Revisão Estratégia de Defesa, o Reino Unido recentemente enfatizou ao público a necessidade de mais gastos militares, mas Chalmers diz que nem Downing Street, nem a maioria dos governos europeus, prepararam seus eleitores para os sacrifícios que esses gastos vão exigir.
O cronograma para atingir os 5% é um ponto-chave. Os aliados da Otan pediram um prazo de 7 a 10 anos. Já o secretário-geral da aliança sugeriu que isso pode ser tarde demais. Com a economia russa totalmente voltada para a guerra, ele alerta que a Rússia será capaz de atacar países da Otan dentro de cinco anos.
Defender a Europa não é só uma questão de quanto os governos gastam. Tão importante quanto é saber com o que eles gastam esse dinheiro.
Uma das grandes fragilidades da Europa é a enorme duplicação e incompatibilidade de capacidades militares no continente. Só na União Europeia, por exemplo, existem 178 diferentes tipos de sistemas de armamento e 17 modelos distintos de tanques. Colocar de lado o orgulho nacional e os contratos de defesa, e reunir os recursos europeus de forma mais eficiente é uma discussão delicada e que provavelmente será deixada de lado na cúpula dessa semana.
Então, o que podemos esperar como resultado concreto?
Isso vai depender bastante de Trump. O embaixador de Trump na Otan disse que essa reunião pode ser histórica.
“Um ponto de virada”, foi como outro diplomata de alto escalão descreveu para mim — e, possivelmente, “a cúpula mais importante da Otan desde a Guerra Fria”: o momento em que a Europa começou a gastar tanto quanto os Estados Unidos em defesa e realmente assumiu a responsabilidade por sua própria segurança.
As bombas da Otan que deram início a uma nova era de guerras
‘Não criem caos na Ásia’: a dura resposta da China à acusação da Otan de ajuda à Rússia contra Ucrânia
Qual o papel da Otan no confronto entre Rússia e Ucrânia?
Dursun Aydemir/Anadolu/Getty Images via BBC
Enquanto o mundo prende a respiração para ver o que acontece depois dos ataques diretos dos EUA contra instalações nucleares iranianas e o frágil cessar-fogo anunciado entre Israel e o Irã, o presidente americano Donald Trump é esperado na Holanda nesta terça-feira (24/06) para a cúpula da Otan.
Essa será a primeira reunião de Trump na Otan desde que ele foi reeleito. No passado, ele acusou os países membros da aliança de se apoiarem demais nas garantias de segurança dos Estados Unidos. Agora, os aliados europeus estão desesperados para provar que ele está errado e esperam convencê-lo a não retirar tropas americanas do continente.
“As relações com a Europa estão tão tensas desde que Trump retornou à Casa Branca — por causa das tarifas e outras questões — que, até algumas semanas atrás, nós não sabíamos se ele ia aparecer nessa cúpula”, me disse um diplomata de alto escalão sob condição de anonimato.
“Com a Rússia e a China de olho em qualquer sinal de fraqueza do Ocidente, isso teria sido um desastre.”
O secretário-geral da Otan, Mark Rutte, montou essa cúpula em torno de Trump. Ele pretendia bajulá-lo concordando com um aumento significativo nos gastos com defesa para mostrar que os europeus estão dispostos a assumir mais responsabilidade pela própria segurança.
Rutte também esperava que, ao manter o encontro focado na questão financeira, ele conseguiria evitar qualquer atrito ou explosão entre Trump e seus aliados.
Mas esse plano, que foi cuidadosamente elaborado, pode estar desmoronando.
Agora que o Irã lançou mísseis nas bases americanas no Catar e no Iraque, em resposta aos ataques de sábado (21/06) contra suas instalações nucleares, o presidente dos EUA pode decidir permanecer na sala de crise da Casa Branca, em Washington.
Se ele realmente for para a Europa, como é esperado, como será possível não falar sobre o Oriente Médio considerando o que está em jogo?
Isso abriria espaço para um possível conflito entre Trump e os aliados europeus, que defendem a via diplomática — e não bombardeios — no caso no Irã.
Trump adora uma vitória e ele é extremamente sensível a críticas. Ele não vai querer nenhum tipo de desaprovação durante a reunião da Otan.
Separadamente, já tinha sido garantido a ele um triunfo na cúpula, com países europeus se comprometendo a gastar impressionantes 5% do PIB com defesa — exatamente como ele exigiu nas primeiras semanas após voltar à Casa Branca.
“Essa cúpula é sobre credibilidade”, resumiu o embaixador dos EUA na Otan, Matthew Whitaker.
Mas, no domingo, a Espanha afirmou ter conseguido uma exceção nesse plano de gastos, algo que Rutte negou.
Outros aliados europeus que também estão com dificuldades para encontrar esse dinheiro extra começaram a mostrar incômodo.
A questão é: a Europa precisa manter os EUA, uma potência militar e nuclear, do seu lado. Foi assim que Rutte conseguiu convencer líderes relutantes — com exceção da Espanha — a aderir à nova onda de gastos. É um compromisso enorme.
Mas, como me disse a ex-embaixadora dos EUA na Otan, Julianne Smith, mesmo assim, não há garantia de nada com Trump.
Não está claro se os Estados Unidos vão assinar a declaração conjunta ao final da cúpula desta semana, que deve apontar a Rússia como principal ameaça à aliança da Otan.
A confiança da Europa nos EUA como seu protetor final tem sido abalada pela postura aparentemente branda de Trump em relação a Moscou, e também pela pressão agressiva que ele tem feito sobre Kiev ao tentar encerrar a guerra na Ucrânia.
Além disso, na noite de sexta-feira (20/06), quase dava para ouvir os diplomatas europeus “rangendo os dentes”, depois que Trump justificou, com naturalidade, a meta enorme de 5% em gastos com defesa que impôs aos aliados, ao mesmo tempo em que isentava a si próprio e os EUA desse compromisso.
“Eu não acho que nós deveríamos, mas eu acho que eles deveriam”, disse Trump. “Nós temos apoiado a Otan por tanto tempo.. então, eu não acho que nós deveríamos, mas eu acho que os países da Otan deveriam, com certeza.”
Por outro lado, os líderes europeus discutem se eles deveriam estar mais preparados nesse sentido, em termos de auto-defesa.
Trump talvez seja o mais direto e imprevisível, mas está longe de ser o primeiro presidente a querer redirecionar a atenção militar e os investimentos da Europa para outras áreas prioritárias, especialmente o Indo-Pacífico. O próprio Barack Obama foi muito claro sobre isso em 2011.
Os Estados Unidos têm armas nucleares armazenadas na Itália, Bélgica, Alemanha e na Holanda. Também têm cerca de 100 mil soldados prontos para combate espalhados pela Europa, 20.000 deles posicionados em países da Otan no Leste Europeu, enviados por Biden depois da invasão em grande escala da Rússia na Ucrânia.
O continente até poderia compensar uma possível redução no número de tropas americanas, especialmente com a Alemanha e Polônia planejando expandir significativamente suas forças terrestres nos próximos anos. Mas, a dependência da Europa dos Estados Unidos vai muito além disso, diz Malcolm Chalmers, vice-diretor do Royal United Services Institute.
A Europa depende de Washington para coleta de inteligência, vigilância, capacidade aérea e comando e controle. Os EUA exercem um papel de liderança crucial na Otan, integrando forças e aliados.
Essas são exatamente as capacidades escassas e necessárias para os militares americanos na Ásia, diz Chalmers. Se forem removidas da Europa, levaria muito tempo para serem substituídas.
Até pouco tempo atrás, muitos países da Otan na Europa evitavam investir em certas capacidades continentais — como, por exemplo, ampliar o alcance do chamado guarda-chuva nuclear da França para outros aliados — por medo do que os EUA diriam: “Ah, então vocês não precisam mais da gente. Estamos fora!”.
Mas, agora, a Europa está sendo forçada a assumir mais responsabilidades pela própria segurança, não apenas para persuadir Washington a ficar, mas também no caso do presidente dos EUA decidir se retirar, de forma parcial ou total.
Ninguém sabe das intenções de Trump.
Os líderes europeus na Otan sentiram um grande alívio recentemente, quando a administração americana anunciou que o tenente-geral da Força Aérea dos EUA, Alexus Grynkewich, assumiria o cargo de Comandante Supremo das Forças Aliadas na Europa, uma posição tradicionalmente ocupada por um americano. Isso foi interpretado como um sinal de compromisso com a aliança de defesa.
Mas Washington está conduzindo sua própria revisão de gastos militares e de defesa. Anúncios oficiais săo esperados nos próximos meses. É pouco provável que haja novos financiamentos dos EUA para a Ucrânia. E muito provável que as 20 mil tropas adicionais enviadas ao Leste Europeu sejam as primeiras a serem retiradas do continente.
Apesar disso, a Polônia disse que vai participar da cúpula da Otan com confiança. Em nítido contraste com a Espanha, Varsóvia acredita que está dando o exemplo — gastando mais do seu PIB em defesa (cerca de 4,7%) do que qualquer outro membro da Otan, inclusive os EUA. O objetivo do país é construir o exército terrestre mais poderoso da Europa.
Durante a Guerra Fria, a Polônia viveu sob a sombra da União Soviética. O país faz fronteira com a Ucrânia. Por isso, não é difícil convencer os poloneses que a defesa é uma prioridade.
Para políticos em países distantes da Rússia, o argumento é mais difícil. A imprensa espanhola tem sido alimentada com especulações de que os desacordos sobre os gastos com defesa podem até derrubar o governo de coalizão do país.
Tentando ao mesmo tempo agradar Trump com o compromisso de aumentar os gastos com defesa, enquanto torna a proposta mais palatável para líderes europeus com orçamentos apertados, a Otan está propondo dividir a meta de 5% em duas partes: 3,5% da renda nacional anual seria destinada à defesa, com os outros 1,5% do PIB para áreas “relacionadas à defesa”, como, por exemplo, a expansão de portos de carga na Holanda ou o investimento da França em cibersegurança.
Esse modelo ainda teria a vantagem de alinhar a Europa com o nível atual de gastos militares dos EUA, que está em 3,4% do PIB, um marco simbólico importante, segundo Camilla Grand, ex-secretário-geral adjunto de Investimentos em Defesa da Otan e hoje especialista no Conselho Europeu de Relações Exteriores.
Mas, independentemente de como ficarão os números, nós estamos falando de governos gastando bilhões a mais com defesa. E esse dinheiro precisa sair de algum lugar — seja por meio de novos impostos (um método que a Estônia tem experimentado), seja por meio de mais endividamento, o que sai caro para países como a Itália, que já tem altos níveis de dívida pública.
Outra opção é cortar gastos sociais, o velho dilema conhecido como “canhões ou manteiga” ou “tanques ou pensões”.
Com sua Revisão Estratégia de Defesa, o Reino Unido recentemente enfatizou ao público a necessidade de mais gastos militares, mas Chalmers diz que nem Downing Street, nem a maioria dos governos europeus, prepararam seus eleitores para os sacrifícios que esses gastos vão exigir.
O cronograma para atingir os 5% é um ponto-chave. Os aliados da Otan pediram um prazo de 7 a 10 anos. Já o secretário-geral da aliança sugeriu que isso pode ser tarde demais. Com a economia russa totalmente voltada para a guerra, ele alerta que a Rússia será capaz de atacar países da Otan dentro de cinco anos.
Defender a Europa não é só uma questão de quanto os governos gastam. Tão importante quanto é saber com o que eles gastam esse dinheiro.
Uma das grandes fragilidades da Europa é a enorme duplicação e incompatibilidade de capacidades militares no continente. Só na União Europeia, por exemplo, existem 178 diferentes tipos de sistemas de armamento e 17 modelos distintos de tanques. Colocar de lado o orgulho nacional e os contratos de defesa, e reunir os recursos europeus de forma mais eficiente é uma discussão delicada e que provavelmente será deixada de lado na cúpula dessa semana.
Então, o que podemos esperar como resultado concreto?
Isso vai depender bastante de Trump. O embaixador de Trump na Otan disse que essa reunião pode ser histórica.
“Um ponto de virada”, foi como outro diplomata de alto escalão descreveu para mim — e, possivelmente, “a cúpula mais importante da Otan desde a Guerra Fria”: o momento em que a Europa começou a gastar tanto quanto os Estados Unidos em defesa e realmente assumiu a responsabilidade por sua própria segurança.
As bombas da Otan que deram início a uma nova era de guerras
‘Não criem caos na Ásia’: a dura resposta da China à acusação da Otan de ajuda à Rússia contra Ucrânia
Qual o papel da Otan no confronto entre Rússia e Ucrânia?